Crise de tosse ou de Capital
Tradução e redação: Victor Urio
Com o agravamento da pandemia de Covid-19 na América Latina, e em particular no Brasil, cada vez mais buscam-se soluções nos experimentos de contenção realizados ao redor do mundo. Em reflexo direto da crise sanitária, observamos a intensificação da crise econômica que havia iniciado logo antes da disseminação do vírus. Em muitos lugares onde a quarentena foi mais estritamente imposta, setores empresariais clamam por ajuda governamental para não demitirem em massa seus funcionários. Onde a quarentena está mais frouxa, os funcionários temem por suas saúdes, muitas vezes estando na linha de frente da contaminação.
Procurando entender como os outros países lidaram com as tribulações econômicas desse momento, buscamos contato com empresários ao redor do mundo. Conseguimos, por meio do empreendedor beltronense Antonio Frozza (proprietário da MTA), resposta de um fornecedor chinês, que habita o país que vivenciou o epicentro inicial da pandemia; e de um empresário colombiano, chamado Juan Peláez.
Na China, em contraste com o autoritarismo que permeia todas as esferas da vida civil, a intervenção governamental para ajudar os trabalhadores e empresários foi mínima. O entrevistado, que preferiu o anonimato, comenta: “Para ser franco, nós e nossa fábrica não podemos obter suporte do governo, todas as perdas e taxas devem ser pagas por nosso empresário”. Ainda adiciona o contraste regional pois estão “em uma situação melhor que o Sul da china, nossos trabalhadores são locais; mas a maioria dos trabalhadores no Sul da China vem de outras províncias. Quando eles são demitidos, eles têm dificuldade em achar novos trabalhos rapidamente, então terão grandes problemas em pagar o aluguel de seus apartamentos, recursos básicos e etc.”. Curiosamente, os problemas relatados são similares aos que os trabalhadores dos EUA têm sofrido.
Ao contrário de rumores, a China não fez compra de ações americanas em massa, tentando proteger sua economia com a compra das próprias ações chinesas. Tiveram um impacto significativo na produção, ainda que, conforme o entrevistado dispõe, a automatização ameniza as perdas produtivas. Em relação a aguda desvalorização do Real, já em declínio desde antes do primeiro caso relatado, Robert (pseudônimo do empresário chinês) adiciona que os EUA fazem pressão para que o Iene chinês não desvalorize, pois a ocorrência disso poderia tornar o país mais atrativo ainda para empresas americanas.
Nosso outro entrevistado indica uma situação ligeiramente mais próxima da nossa. Embora tenha um número consideravelmente menor de casos e muito mais restritos geograficamente, o impacto econômico da quarentena também ocorreu. Ele comenta da necessidade de consumo para manter a estabilidade financeira, e pontua que a força produtiva da China, já restabelecida, não consegue por conta própria voltar a crescer. Ela depende do consumo mundial, e embora o mercado interno seja capaz de absorver parcialmente a demanda, os efeitos dessa estagnação serão sentidos no mundo todo.
Sobre a situação específica da Colômbia, o entrevistado diz: “O governo não ajuda as empresas como se faz nos EUA, dando suporte para pequenas e médias empresas para que continuem com condições de operar (tendo caixa) e seguir pagando seus funcionários por pelo menos dois meses que é o tempo da quarentena”. Ainda adiciona, sobre os orientais: “(…)mas isso não ocorreu na China. Assim, as fábricas ficaram com 100% da capacidade de operação disponível, mas não haviam pedidos, não havia demanda para produzir.”
Levando em conta a dependência do mercado latino em relação a China (o Brasil incluso), até mesmo propostas de alternativas são falhas, como o empresário comenta sobre os colombianos e a sugestão de industrialização por substituição de importação. Sem a matéria prima, que vem das fábricas asiáticas, não se pode sequer replicar os produtos outrora importados.
Para o colombiano, não há motivos para otimismo. Ele supõe o fechamento de muitas empresas, especialmente as que não se modernizarem, citando o crescimento da Amazon como empresa de entregas online. A crise do petróleo, que já estava em vigor antes da pandemia, também afetará os países produtores, em particular México e Venezuela.
Por fim, o entrevistado comenta de complicações sobre a política. Segundo ele, o presidente “(…) é complicado, não há liderança. Tem um presidente que não tem visão clara do que precisa ser feito, desconhece a realidade e só pensa na sua reeleição”.
Em nossa região, o Sr. Frozza (empresário do ramo de aluminios que nos proporcionou esse contato internacional), menciona suas preocupações com a guerra comercial que está a pleno vapor dos EUA e da China. Inclui em seu discurso o fato de que os Orientais passaram a utilizar-se de criptomoedas e desvincularam o dólar de seu mercado interno. Demonstrou-se consternado com a possibilidade do vírus ser uma “arma biológica”, parte dessa “nova guerra fria”.
Embora anteriormente pesquisadores indicassem que o vírus não teria origem humana, recentemente surgiram rumores de que a pandemia se originou em um vazamento de um laboratório biológico em Wuhan. Se algum dia poderemos afirmar que quaisquer dessas afirmações são verdadeiras, não sabemos.
Nós, do sudoeste do Paraná, estamos muitas vezes acostumados a sermos um “canto esquecido do mundo”. Infelizmente, com a economia globalizada e a vastidão da pandemia, os problemas nos alcançaram. Os prenúncios negativos do porvir se aplicam tanto aqui quanto em qualquer outro lugar do mundo.
Com base nas entrevistas, podemos observar uma grande semelhança internacional das recessão ligada ao COVID-19. Nos dois lados do mundo observamos um governo incapaz — ou desinteressado — em ajudar seu próprio povo, e tampouco os governantes são capazes de aliviar o estresse econômico. Vale notar que grande parte desse estresse deriva da dependência de duas potências —EUA e China— ambas focos da doença, em momentos diferentes. O cenário que se pinta é de um futuro nebuloso, de escassez. Espera-se que essa semelhança de situações desperte solidariedade, e não a manutenção das relações exploratórias de mercado que vemos subjugar o Brasil e toda america latina.