ALETHEIA
Noites Brancas e as perspectivas de mudança pós-pandemia
Dizem que somente após um grande choque de realidade as pessoas amadurecem e conseguem enxergar a realidade como de fato ela é. Nisso, a visão pessimista, diga-se, é a mais conveniente em um mundo de seres com potencial de fazer tanto mal, como o homem. A reflexão dessa vez é retirada de Noites Brancas, de Fiodor Dostoievski. Não se trata do cânone de sua obra, como Crime e Castigo, ou Os Irmãos Karamazov; mas o gracioso Noites Brancas vem a calhar.
Nesse sentido, Dostoievski foi grandioso quando, em poucas páginas, expôs no narrador-personagem, protagonista da obra, a real faceta da solidão e, em boa parte, da falta de experiência que a pouca idade traz ao homem. O sonhador, como indica o escritor, é o jovem.
O sonhador, veja bem, enxerga beleza exageradamente onde não há. Romantiza até a mais indesejável das situações, como a solidão, em busca de disfarçar a tristeza que essa situação lhe confere. Na obra, o sonhador precisou sofrer desprezo de seu grande amor para reconhecer a realidade a sua volta. Foi necessário esse mal para que houvesse uma evolução humana no personagem. E nisso, Dostoievski acerta com primazia, alertando-nos de que há sim proveito em situações adversas: elas nos ensinam a ter pé no chão e a buscar formas de se enfrentar os desafios da vida, e não mascará-los, ou fugir deles.
O final da obra não é conveniente de ser exposto aqui. Para isso o leitor desta coluna deve procurar ler a obra e se engrandecer por sua qualidade.
Todavia, a questão que tiro desse livro é a seguinte: o que o brasileiro vai aprender assim que passar essa pandemia? Será que romantizaremos os erros dos governantes, para se buscar manter boas imagens deles? Será que defenderemos o individualismo extremado e sem empatia, quando, no momento, a coletividade é que tem mantido a sociedade em pé?
O brasileiro na realidade tem em suas mãos o poder de continuar sendo um sonhador, um romantizador da realidade desgraçada, ou então, um realista. Por último, parafraseio Dostoievski, em Noites Brancas: “Quando estamos infelizes, percebemos com mais nitidez a desgraça dos outros: o sentimento não se despedaça, mas se concentra”.