CRÔNICAS
A irmã mais nova
Na minha família a classificação da prole é bem simples, eu sou a mais velha e ela é a mais nova.Hoje, apresento ao respeitável público a mais desejada de todas as irmãs,Géssica Priamo. O seu nome é escrito com G, é uma variante de Jéssica com J, é uma versão feminina de Jessé, que no hebraico (Yishay) significa “presente de Deus” ou “dada por Deus”.
Eu tinha dez anos quando ela nasceu, desejava muito ter uma irmã e esperei ansiosa pela sua chegada. O nascimento dela estava previsto para o início de dezembro, ela mesmo sendo uma menina, representaria Jesus Cristo na encenação de Natal, mas para mostrar ao mundo que tinha autonomia para fazer as suas próprias escolhas, decidiu nascer três dias depois.
Digna de ser uma verdadeira capricorniana que não faz nada por impulso,desde bebê evitou ao máximo correr riscos, sempre foi cautelosa, empenhada e persistente.Quando eu a vi pela primeira vez fiquei encantada,afinal, eu sonhava com a nossa cumplicidade. Ela era tão pequenina e rosada que parecia um leitãozinho. Chorava demasiadamente, só dormia se desce tapinhas no bumbum, e lá ficava eu durante o dia e também na madrugada, contando tapinhas ao invés de carneirinhos.Eu fazia muitos planos para viver com ela, mas não imaginava que ela completaria apenas 3 meses e meus pais já iam enfiar ela dormir comigo.
Quem supõe que perder o sono diversas vezes durante à noite é a pior parte, está enganado.Ela cresceu, aprendeu andar, a falar e coube a mim,primogênita, a responsabilidade de alimentar, trocar, brincar e cuidar da higiene da irmã caçula.Ainda não sei, mas acredito que ela nasceu com trauma de água, era colocá-la na banheira que a gritaria começava, e adivinha quem levava umas palmadas da mãe no final? Eu, é claro.
Quando ela tinha uns quatro anos, aprendeu andar de bicicleta, esse momento foi o fim da minha liberdade. Onde eu ia, ela estava de atrás, não foram poucas as minhas manobras para sair escondido. Acredito que ela nasceu com a intuição bem desenvolvida, ela sentia que eu queria sair de casa, então,colava em mim e não desgrudava. Se eu fizesse algo escondido, a minha guarda-costas chegava até meus pais e relatava todos os acontecimentos.Às vezes, ela se esquecia dos fatos em troca de alguns pirulitos, mas era bem raro.
Passamos apenas cinco anos juntas, quando eu completei quinze anos, fui embora para terminar os meus estudos. Pensei: viva a minha liberdade! Mas adivinha? Eu morria de saudades. Eu ia para casa todo final de semana, só para ver ela, e quando chegava a hora de despedir-me,saía com o coração partido. Naquela época, ela também era escritora, escrevi aliteralmente em todas as paredes da casa,fazia-me várias cartinhas que ainda as mantenho guardadas. Se eu tivesse em casa, com certeza, ela teria que fazer caligrafia, mas isso já é outra história.Ela desenhava corações enormes e colocava o meu nome dentro deles, depois dizia que me amava e eu, obviamente,derretia-me com aquilo.
É uma pena que muitos pais calculam mal o tempo de intervalo para terem os filhos. Os dez anos de diferença entre nós,afetou bastante a nossa convivência.Ela era uma criança e eu uma jovem, ambas cheias de sonhos. Para poder estudar eu fui morar em outra cidade, e as minhas visitas semanais mudaram para anuais. Cada vez que a via, ela estava maior. Crescer nunca foi um problema para ela, não me refiro apenas a altura, mas a todos os sinônimos de progredir. Os anos passaram, de repente, deparei-me com uma mulher com seus próprios ideais de vida.
Fomos separadas pelo tempo, mas continuávamos ligadas pelo amor verdadeiro, pelo carinho desmedido e pela generosidade sincera. Irmãs possuem um laço que não se desfaz facilmente, mesmo que, uma vez ou outra, ele fique frouxo, o laço estará sempre lá, segurando a irmandade e mantendo firme o sentimento que as une.
Mesmo que cada uma de nós segue caminhos diferentes, a família sempre será a nossa ligação e a maior de todas as instituições.A fraternidade serve para mantermos viva a nossa conexão e termos cuidados uma pela outra. Por isso, choramos juntas, uma pela dor da outra. Depois, celebramos as conquistas. Também discordamos e discutimos. A condição de uma ser mais velha e outra mais nova não interfere, nem é uma condição marcante,há ônus e bônus em cada uma das posições. O que realmente importa é a cumplicidade, o respeito e o amor que existe entre nós.