CRÔNICAS
Terapia no salão de beleza
Toda a cabeleireira é um pouco psicóloga. Empatia e delicadeza são requisitos dessa profissão. Você entra no salão, entrega a cabeça nas mãos da hair stylists, sai com o visual renovado e a mente espairecida. Cria-se um elo de confiança tão grande que ainda não descobriu se é pela afinidade, massagem no lavatório ou as revistas disponíveis para leitura.
A visita ao salão vai além de um simples corte ou pintura das madeixas. As pessoas se sentam na poltrona e aproveitam o tempo para contar as suas histórias de vidas, sofrimentos, qualidades e defeitos. O local é o primeiro passo para quem precisa dar uma repaginada. Uma tesoura tem múltiplos poderes, o corte surge da necessidade à vaidade, porém o principal objetivo é abraçar uma nova imagem.
Estilos e personalidades fazem parte da referência feminina. Morena ficando loira, cacheada querendo alisar, cabelos longos ficam curtos, mechas surgem para iluminar. O trabalho vai além da simetria perfeita, é entre um atendimento e outro que as sessões de psicologia começam. A conversa flui com olhares no espelho, com a mistura de desabafos e cremes para pentear surge a vontade de inovar.
Ah! Que bom seria se a vida tivesse uma transformação tão fácil como uma mudança de visual! O salão é um confessionário perfeito, onde clientes revelam os seus pecados. Às vezes a profissional estética ouve tantos problemas estapafúrdios, e vê que a cliente quer descontar o que sente no cabelo, fazendo pedidos radicais. Nesse momento, surge a mediação profissional, que antes de qualquer ação, coloca-se no lugar da outra pessoa, conversa, dá conselhos para evitar que o novo visual não se torne mais uma situação desagradável.
Um salão não é considerado um consultório, entretanto, gera inúmeras reflexões: Por que as pessoas mudam tanto a aparência? A insatisfação externa reflete a interna? O descontentamento revela um vazio existencial? O cuidado com o corpo mostra uma atitude de autovalorização? As pessoas conseguem amar a si próprias, mesmo sabendo das suas imperfeições?
Uma mulher enrola o cabelo. Alisa. Alonga. Apara as pontas. Troca a cor ou o corte. Ondula. Muda drasticamente o corpo. Enquanto vive cada um desses processos, existe algo dentro dela que também clama por modificar-se. Ela quer saber se existe uma esperança de alterar o seu redor, e pensa que começando por fora, será mais fácil continuar a mudança por dentro. Ela precisa que lhe deem vitalidade. Quer motivação, ser elogiada, ouvir alguém dizer que ela está linda.
A metamorfose é positiva para a vida, contudo, trabalhar a autoestima, também, é importante para saber lidar com os limites, reconhecer as qualidades e cuidar do próprio eu com autoconfiança. Mudanças simples ou abrangentes, estéticas ou cirúrgicas, também precisam de moderação, a satisfação da imagem é tão essencial quanto o equilíbrio emocional. Afinal, “Em terra de descabeladas, quem tem o cabelo arrumado e a cabeça no lugar pode ser considerada rainha.” Por isso, é fundamental a harmonia interna e externa. A vida é como uma ida ao salão, em algum momento, o corte pode não sair como esperado, mas não tem problema, o tempo passa, e o cabelo crescerá novamente.