CRÔNICAS

O vendedor de lâmpadas

No meio da noite precisei levantar e meu abajur resolveu manter-se em sono profundo, apertei várias vezes no interruptor, e nada, a escuridão era a única presença no quarto. O pobre coitado havia perdido um membro que não pertencia ao seu corpo, mas que era essencial para o seu funcionamento. Tudo na vida tem um prazo de validade, geralmente, quando os objetos não têm mais utilidade é melhor descartá-los.

Por muitos anos aquele abajur iluminou o cômodo, trazendo luz, conforto e segurança. Sempre gostei do seu formato cilindrico, neutro, combinava com a mobília do quarto. Então resolvi lhe dar uma chance, decidi que na manhã seguinte iria comprar uma lâmpada nova para trazer-lhe uma vida iluminada.

Fui até uma loja de materiais elétricos para comprar uma lâmpada para o meu querido abajur, sem a companhia dela, ele era um ser infeliz e incompleto.

– Bom dia! O que a senhora deseja?

– Preciso de uma lâmpada para um abajur.

– A senhora quer uma lâmpada normal ou especial?

– Mostra-me as opções disponíveis para que eu possa decidir.

É claro, disse o vendedor.

– Acompanha-me, por favor.

O vendedor era um homem de quarenta e poucos anos, alto, magro, cabelo levemente grisalho, vestia calça jeans e uma jaqueta com o logotipo de uma revendedora de motos, enquanto ele me conduzia até as prateleiras das lâmpadas, deduzi que ele não havia ganhado o uniforme e que era novato na empresa.

Diante de um mostruário enorme de lâmpadas, com os mais variados formatos, perguntei:

– Qual dessas é melhor? Ele nervoso e ao mesmo tempo perdido, não soube me responder, apenas leu algumas informações nas embalagens.

Disse a ele que a lâmpada era para o quarto e que gostaria de uma iluminação mais suave para deixar o ambiente agradável, porém a minha descrição não lhe ajudou em nada, não trouxe nenhuma luz a sua procura. Eu, com pouco entendimento, não sabia qual lâmpada escolher. Ele com pouco conhecimento, não sabia qual lâmpada me vender.

Ficamos ali, uns dez minutos parados. Eu tentando imaginar o que levou aquele homem trabalhar naquela empresa.  Acredito que ao mesmo tempo em que eu tentava entender o seu emprego, ele também estava imaginando quais seriam as minhas intenções, se eu estava ali porque queria realmente comprar ou se estaria roubando-lhe o tempo. Perguntas que surgem na mente, tanto dos vendedores, como dos clientes.

Na vida, ninguém nasce sabendo, até os homens mais sábios, independente da idade, sempre têm algo para aprender. Toda profissão é importante, todo trabalho tem valor, No mundo de lobos selvagens, muitos dão o seu melhor para sobreviver.

Sai da loja com uma torneira elétrica, um filtro de linha com cinco tomadas, um chuveiro, um cortador de grama, quatro refletores e um detector de metais, que até hoje não encontrei uma verdadeira utilidade. Não sei dizer se o suposto novato era um bom vendedor ou se eu era uma má compradora. Simplesmente, gastei mais do que precisava, e ainda comprei a lâmpada errada para o abajur. Lembro-me desde momento todos os meses, quando vou pagar as enormes parcelas de quem foi numa loja, apenas para comprar uma lâmpada.

Joceane Priamo

Joceane Priamo nasceu em Francisco Beltrão-PR, em 23 de maio de 1988. É formada em Letras Português e Literatura pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO) e Pedagogia pela Faculdade Campos Elíseos (FCE), pós-graduada em Docência no Ensino Superior, Antropologia, Educação Especial e Intelectual. Em março de 2021, lançou seu primeiro livro, Francisco Beltrão entre Versos e Sonhos. Participa da coordenação da Via Poesis e como membro do Centro de Letras de Francisco Beltrão, é professora, escritora, poetisa e cronista.