Coluna Aletheia
“A Peste”, de Albert Camus: Realidade, ficção e Coronavírus.
“O seu papel era diagnosticar. Descobrir, ver, descrever, registrar, depois condenar, essa era a sua tarefa. Esposas agarravam-lhe as mãos e gritavam: ‘Doutor, dê-lhe vida!’ Mas ele não estava ali para dar vida, estava ali para ordenar o isolamento. De que servia o ódio que lia, então, nas fisionomias? “O senhor não tem coração’, tinham lhe dito um dia. Sim, ele tinha um coração. Servia-lhe para suportar vinte horas por dia em que via morrer homens que haviam sido feitos para viver. Servia-lhe para recomeçar todos os dias. De agora em diante, o coração mal dava para isso. Como esse coração seria suficiente para dar vida?”. – A Peste, Albert Camus.
Nesses momentos de pandemia, surtos e desesperança, lembrei-me da obra de Camus. Adequa-se muito ao tempo que vivemos, e sobre ela embasarei esse artigo que vos exponho.
A trama se passa em um período indefinido na década de 40 do século XX. O mundo havia sido tomado por uma peste indecifrável, de altíssimo contágio e letalidade, nunca antes acometida na humanidade. A história, no entanto, é focada em Dr. Rieux, um médico de uma das cidades acometidas da peste.
Sob o olhar desse personagem, analisamos a condição humana em situações da perca de fé e pânico. Ao médico, ficava vedada sua observação aos acontecimentos: todos os dias, mortes ininterruptas por conta da doença, tantas que se tornaram cotidianas, normais. Indiferentes.
Os cemitérios não comportavam o número de óbitos diários. Foi necessário reservar aos mortos a cremação coletiva, sem cerimônia.
A peste perdurou por tanto tempo que esgotou a população. O efeito mais perigoso do esgotamento, consequentemente, foi a negligência. As pessoas passaram a desprezar as regras de higiene e desinfecção para prevenir o contágio.
A obra de Camus sem dúvidas se encaixa à realidade. Ainda vivemos no início da peste do Covid-19. Ainda resistimos com medidas preventivas – ao menos, a maioria das pessoas sensatas continuam se cuidando. Entretanto, estamos iniciando a etapa de mortes incessantes. A cada dia, milhares de pessoas morrem apenas por conta do coronavírus. A realidade que Dr. Rieux exemplificou, de acontecerem tantas mortes ao ponto de tornarem-se indiferentes, já é uma realidade para a maioria dos médicos que são linha de frente contra o coronavírus.
Por isso, faça sua parte. Previna-se da doença obedecendo o isolamento social e as mediadas de desinfecção, como o álcool gel. Use máscara se necessário. Mais do que nunca, é preciso união para vencer esse mal comum e dar apoio aos inúmeros guerreiros da saúde, que se arriscam diariamente para lutar contra a doença.
Diferentemente do exposto em “A Peste”, é importante termos perseverança, para seguir os procedimentos de cuidados individuais, e, acima de tudo, é importante mantermos a fé. Fé de que, assim como outras pestes assolaram a humanidade e foram superadas, a pandemia de coronavírus faça parte apenas de um período breve, mas sombrio, da história.